domingo, 11 de maio de 2008

PREFÁCIO - "Fui... O que já não sou!", Paulo Themudo

"Fui... O que já não sou!"
Paulo Themudo
Edium Editores, 2008


Entrando na Poesia de Paulo Themudo é como se nos preparássemos para percorrer um mundo onde a palavra e a imagem se mesclam na perfeição. Uma existe para comprovar a existência da outra. É um jogo entre dois pólos sempre presente nos seus poemas quando os visito.

Talvez esta minha visão surja contaminada pela ideia inicial que em mim se construiu sobre este autor. Quando tive contacto com a sua Poesia, esparsos lidos através da Internet, senti curiosidade em saber mais sobre ele. Nessa minha pesquisa, encontrei uma outra sua faceta artística, a pintura. Se os poemas revelavam a construção do visual, agora o visual também desvelava a edificação do poema.

O certo é que a dúvida sobre qual das duas vertentes é pré-existente, torna a sua leitura ainda mais apelativa. Há, no fundo, um enigma a desvendar. E quem não aprecia um bom mistério, pergunto.

Agora, que surgiu esta oportunidade de escrever uma nota introdutória sobre esta sua obra: "Fui... O que já não sou!...", nada melhor do que seguir as pistas que a sua Poesia, por certo, possuirá para o revelar.

A primeira sensação é produzida pelas palavras que se abrem para um espaço cénico onde cada sílaba desenha, melhor, esboça um movimento, um gesto preciso porque depurado, feito de arte, criação humana.

Esse vislumbre inicial leva o leitor para a demanda de um enredo repleto de matizes variadas, de um universo sensorial intenso. Em síntese, do próprio espanto, o catalisador essencial de toda a Poesia.

Perpassa neste seu poemário um tom intimista com que impregna as suas palavras. Este timbre revela uma certa tristeza ou angústia, sobretudo quando mesura os passos dados para a desocultação e para o questionar do seu próprio caminho.

Apetece recordar Arthur Schopenhauer, filósofo alemão do século dezanove, porque há em Paulo Themudo, na minha óptica, a visão da arte como atenuante para o sofrimento do Homem.

E é neste último ponto, ao ler este tomo e ao regressar à sua obra plástica, que descubro o reverso do que antes pensava. Ou seja, buscando o mais ínfimo detalhe comum às suas formas de intervenção artística, encontro a musicalidade, quer pelo jogo fonético presente nos seus poemas, quer pelas sensações que a abstracção dos seus quadros desperta.

E é efectivamente a música que Arthur Schopenhauer considera como a melhor via em arte para o apaziguamento do padecimento humano porque esta se apresenta desprovida de qualquer imagem externa.

A leitura deste “Fui... O que já não sou!..." é uma autêntica viagem por um mundo de sensações que, embora sejam do poeta ou pelo poeta apropriadas, em nós desperta múltiplas questões sobre a nossa própria existência.

Agora, como uma espécie de advertência, é preciso não esquecer que estamos perante uma obra de arte, ou seja, erigida com o pressuposto de gerar fruição a outro, alheio ao criador, mas sendo a face ou a máscara do poeta o que perante nós se apresenta, esse acordar de interrogações é incontornável.

Quanto ao enigma inicialmente proposto, não sei qual a resposta, nem ao autor formularei tal questão. Imagino Poesia e pintura num processo dialéctico cuja síntese é a música. Talvez o leitor ao tomar como sua esta obra poética, transformando-a sob a sua própria forma de olhar o mundo, o decifre. Talvez.

Xavier Zarco
Coimbra, 31 de Dezembro de 2007

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